Canal do Itajuru - Foto: Halley Pacheco de Oliveira (Licença-cc-by-sa-4.0) |
A ocupação humana das terras onde viria se estabelecer o município de Cabo Frio teve início há mais ou menos 6.000 anos, quando um pequeno bando nômade de famílias chegou em canoas pelo mar e acampou no Morro dos Índios, então uma pequena ilha rochosa na atual barra da Lagoa de Araruama e ponto litorâneo extremo da margem de restinga do Canal do Itajuru.
Conforme as evidências arqueológicas encontradas nesse sambaqui, que mais tarde seria abandonado pelo esgotamento de recursos para sobrevivência, o grupo nômade dispunha de tecnologia rudimentar e baseava-se numa economia de coleta, pesca e caça, onde os moluscos representavam quase todo o resultado do esforço para fins de alimentação e adorno. Há mais de 1.500 anos, os guerreiros indígenas tupinambás começaram a conquista do litoral da região.
Os restos arqueológicos das aldeias tupinambás na região de Cabo Frio ('Três Vendas', em Araruama e Base Aérea Naval de São Pedro da Aldeia em São Pedro da Aldeia) e também nos acampamentos de pesca ('Praia Grande', no Arraial do Cabo) evidenciam uma adaptação ecológica mais eficaz que a dos bandos nômades pioneiros. O profundo conhecimento biológico da paisagem regional, em particular da Lagoa de Araruama e dos mares costeiros riquíssimos em recursos naturais, fez com que o pescado se tornasse a base alimentar dos tupinambás, reforçada pela captura de crustáceos, gastrópodes e moluscos.
A vegetação de restingas e mangues da orla marítima oferecia excepcionais possibilidades de coleta de recursos silvestres, o que levou ainda à horticultura de várias espécies botânicas, destacando-se a forte presença da mandioca no cardápio, bem como ao domínio das técnicas de cerâmica. A caça, atividade masculina exclusiva, era muito importante como complemento de proteínas na dieta alimentar dos grupos locais.
Os índios tupinambás batizaram a região de Cabo Frio como 'Gecay', que era o nome do único tempero da sua cozinha, feito com sal grosso cristalizado. Nos terrenos onde viria a se estabelecer a município de Cabo Frio, foram encontrados quatro possíveis sítios tupinambás. Os dois primeiros, o Morro dos Índios e a Duna Boavista, apresentam indícios de serem acampamentos de pesca e coleta de moluscos, enquanto o terceiro, a Fonte do Itajuru, próxima do morro de mesmo nome, era a única forma segura de abastecimento de água potável e corrente disponível na restinga.
Na referida elevação junto à fonte, o atual Morro da Guia, acha-se o sítio mais importante da região e um dos mais relevantes do Brasil pré-cabralino: o santuário da mitologia tupinambá, formado pelo complexo de pedras sagradas do Itajuru ('bocas de pedra' em tupi). Sobre estes blocos de granito preto e granulação finíssima, com sulcos e pequenas depressões circulares, os índios contavam histórias do seus heróis feiticeiros que ensinavam as artes de viver e amar a vida. Quando estes heróis civilizadores morriam, transformavam-se em estrelas, até que o sol decidisse enviá-los ao Itajuru, sob forma de pedras sagradas, para serem veneradas pela humanidade. Caso fossem quebradas ou roubadas, todos os índios desapareceriam da face da terra.
Em 1503, a terceira expedição naval portuguesa para reconhecimento do litoral brasileiro sofreu um naufrágio em Fernando de Noronha e a frota remanescente se dispersou. Dois navios, sob o comando de Américo Vespúcio, seguiram viagem até a Bahia e depois até Cabo Frio. Junto ao porto da barra de Araruama, os expedicionários construíram e guarneceram com 24 cristãos uma fortaleza-feitoria para explorar o pau-brasil, abundante na margem continental da lagoa.